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Transtorno Bipolar e Obesidade

O que é o Transtorno Bipolar?

O Transtorno Bipolar (TB) é uma das doenças psiquiátricas graves mais comuns. Globalmente, esse transtorno afeta aproximadamente 60 milhões de pessoas.

O TB refere-se a um transtorno caracterizado por mudanças perceptíveis no humor e na energia do indivíduo, o qual apresenta períodos depressivos e períodos de hipomania ou mania (essa última sendo mais grave, muitas vezes necessitando hospitalização).

Os períodos de hipomania/mania são caracterizados por períodos distintos de humor elevado, expansivo ou irritável e energia aumentada. Além disso, costumam estar presentes outros sintomas, como: autoestima elevada, pensamento acelerado, distratibilidade, redução da necessidade de sono, fala exagerada, aumento da atividade dirigida a algum objetivo e envolvimento em situações de risco (como beber em excesso).

Os períodos de depressão são caracterizados por semanas em que o indivíduo apresenta humor deprimido, redução do prazer e interesse pelas atividades, além de outros sintomas como alterações no padrão de sono, de apetite ou peso, pensamentos de culpa, cansaço fácil, dificuldade cognitiva e até pensamentos de morte.

O diagnóstico é realizado através da entrevista médica e não através de exames.

O TB requer tratamento psiquiátrico contínuo com medicamentos específicos SEMPRE (não existe tratamento para TB somente com terapia) para que a doença não progrida e não cause prejuízo das funções cerebrais.

Prevalência de Obesidade no Transtorno Bipolar

Indivíduos com TB apresentam mais frequentemente sobrepeso ou obesidade, ou maior prevalência de obesidade central (gordura abdominal), ou ambos, em comparação com a população em geral. Pesquisas mostram que até 68% dos pacientes bipolares que procuram tratamento estão acima do peso.

Consequências dessa associação

Antigamente, a questão do ganho de peso em pessoas com doenças psiquiátricas era percebida como menos importante do que o bem-estar mental. No entanto, os médicos hoje reconhecem que a obesidade tem o potencial de contribuir para o surgimento de outras condições de saúde em pessoas com TB, incluindo diabetes, hipertensão, síndrome metabólica e doença cardiovascular. Inclusive, é importante salientar que, pacientes com transtorno bipolar apresentam sobrevida menor do que pessoas sem esse transtorno, e a principal causa de morte não é pelo transtorno em si, mas sim pela doença cardiovascular, que costuma ocorrer uma década ou mais antes, em média, do que na população em geral.

Potenciais fatores que contribuem para a obesidade no transtorno bipolar

Os fatores que contribuem para a obesidade na população com TB são diversos, mas geralmente decorrem de:
- fatores relacionados à doença: estado inflamatório especialmente em momentos de desestabilização, como no episódio de (hipo) mania ou depressão;
- fatores relacionados ao tratamento: o ganho de peso é um efeito colateral comumente relatado de medicamentos usados no tratamento do TB;
- fatores relacionados ao estilo de vida: inatividade física, má alimentação, tabagismo e abuso de substâncias ou ainda uma combinação de alguns ou de todos esses fatores.

Falando mais especificamente dos medicamentos para TB

Entre as medicações utilizadas no tratamento do TB estão os estabilizadores de humor, como o lítio, o ácido valpróico, a lamotrigina e a carbamazepina e, também, os antipsicóticos de segunda geração (ASGs), como risperidona, olanzapina, quetiapina, lurasidona, aripiprazol, ziprasidona e clozapina. Dentre os estabilizadores de humor, o ácido valpróico é o mais associado a ganho de peso. A carbamazepina e a lamotrigina são geralmente neutras em relação ao peso.

Cada vez mais, os ASGs estão sendo usados no tratamento agudo e de manutenção do TB. Entre esses agentes, a clozapina e a olanzapina são fortemente associados com ganho de peso, enquanto a quetiapina e a risperidona estão associados a um risco um pouco menor, mas ainda moderado, de ganho de peso. Esses agentes também estão associados à resistência à insulina, aumento de triglicerídeos e a um aumento no risco de desenvolvimento de Diabetes tipo 2. Vários outros ASGs, às vezes usados no tratamento do TB, apresentam risco muito menor de ganho de peso e alterações metabólicas, estes incluem aripiprazol, ziprasidona e lurasidona.
Entre outros agentes usados de forma auxiliar no tratamento de pacientes com TB, os antidepressivos geralmente têm uma baixa propensão para ganho de peso.

Finalmente, os benzodiazepínicos, algumas vezes prescritos de forma auxiliar e transitória para períodos de agitação e/ou ansiedade em pacientes bipolares, são geralmente neutros em relação ao peso.

Mas, atenção! Não coloque toda a culpa do ganho de peso nos medicamentos!

Embora os medicamentos, muitas vezes, desempenhem um papel significativo no ganho de peso no TB, um estudo italiano com pacientes que nunca tomaram medicamentos descobriu que quase 41% dos pacientes com TB, mesmo não tratados, tinham sobrepeso ou obesidade. Esse risco aumentado está associado ao fato que indivíduos com TB não tratado tendem a apresentar piores hábitos de vida (sedentarismo, dieta rica em alimentos industrializados) e também apresentam mais compulsão alimentar, tanto em episódios de (hipo)mania quanto em episódios depressivos, valendo-se da comida para tentar regular suas emoções.

Qual a importância de tratar a obesidade nos pacientes com TB?

Como a obesidade está correlacionada com piores desfechos no TB, tanto em relação à mortalidade por doença cardiovascular, quanto em relação ao abandono do tratamento e piora do TB em si, a prevenção e tratamento da obesidade é muito importante e pode reduzir a mortalidade e até as taxas de suicídio.

Além do tratamento específico para obesidade, que deve ser feito pelo médico endocrinologista, é importante avaliar com o médico psiquiatra se há possibilidade de troca de medicamentos que podem estar contribuindo para o ganho de peso (não troque ou suspenda seus medicamentos sem o auxílio do seu psiquiatra). E, mais importante ainda: é essencial que indivíduos com TB mantenham hábitos de vida saudáveis, especialmente: dieta adequada, atividade física regular, bom padrão de sono, controle do uso de substâncias tóxicas (como tabaco e álcool). Hábitos saudáveis não apenas reduzem o risco de obesidade, mas também contribuem para a estabilização do TB.

Este texto foi escrito pela Dra. Luciana Péres (@endocrinoluperes) em colaboração com a psiquiatra Dra. Alice Xavier (@alicexavier.psiquiatra).

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