Blog

Veja nossas postagens

O consumo de alimentos processados aumenta o risco de câncer?

O câncer é a segunda principal causa de morte em todo o mundo e estimativas sugerem que mudanças de dieta e no estilo de vida podem prevenir 30% a 50% dos casos de câncer.

Nas últimas décadas, as dietas mudaram, observando-se um aumento no consumo de alimentos ultraprocessados. Evidências sugerem que a ingestão deste tipo de alimentos está associada à obesidade e a outros resultados adversos à saúde, como doenças cardiovasculares, doenças cerebrovasculares, depressão e mortalidade por todas as causas. Além disso, a ingestão de alimentos ultraprocessados pode aumentar o risco de câncer por contribuírem para o ganho de peso, por apresentarem reduzido valor nutricional, bem como pela exposição a aditivos e contaminantes de processamento.

Embora evidências tenham sugerido uma associação positiva entre o consumo de alimentos ultraprocessados e o desenvolvimento de alguns tipos de câncer, alguns resultados ainda são conflitantes e, por isso, o objetivo do estudo que trago hoje foi investigar a associação entre a ingestão alimentar de acordo com o grau de processamento dos alimentos e o risco de câncer em 25 sítios anatômicos usando dados do estudo European Prospective Investigation into Cancer and Nutrition (EPIC).

O estudo

O EPIC foi um estudo de coorte prospectivo, multicêntrico, realizado em dez países europeus. Questionários validados foram utilizados para obter informações sobre o consumo alimentar dos participantes. Os itens alimentares foram classificados de acordo com seu nível de processamento usando o sistema de classificação NOVA:

1. NOVA 1: alimentos in natura ou minimamente processados;
2. NOVA 2: alimentos processados obtidos diretamente de alimentos do primeiro grupo ou da natureza por procedimentos físicos como prensagem, centrifugação e concentração. Ex: azeite obtido das azeitonas, açúcar obtido da cana, sal marinho, etc..
3. NOVA 3: alimentos processados compostos de itens do primeiro grupo, modificados por processos industriais simples. Contam com a adição de uma ou mais substâncias do segundo grupo, como sal, açúcar e gordura. Exemplos: pães artesanais, conserva de peixe e legumes, cerveja, vinho, etc...
4. NOVA 4: alimentos ultraprocessados são elaborados a partir de formulações de ingredientes (ou seja, sal, açúcar, gorduras ou outras substâncias derivadas de alimentos), em sua maioria de uso exclusivamente industrial, bem como são produtos resultantes de uma série de processos industriais. Frequentemente são adicionados corantes, aromatizantes, emulsificantes, espessantes e outros aditivos. Exemplos: carnes processadas (por exemplo, linguiça, salsicha e presunto), refrigerantes, pães e brioches embalados, salgadinhos embalados, sorvetes, bolos, macarrão instantâneo, bolachas, biscoitos, etc...

Resultados

Neste grande estudo, foi demonstrado que o aumento do consumo de alimentos minimamente processados e frescos foi associado à redução de risco de câncer geral e cânceres específicos, enquanto o inverso foi verdadeiro para alimentos processados e ultraprocessados, demonstrando aumento do risco.

O que explica esse aumento de risco?

Vejamos alguns pontos:

· A ingestão de alimentos ultraprocessados e processados pode aumentar o risco de câncer por meio de propriedades obesogênicas (capacidade de fazer as pessoas ganharem peso) e baixo valor nutricional.
· Dietas ricas em alimentos ultraprocessados tendem a apresentar baixa qualidade dietética, alta densidade energética (alta caloria) e estar associada à obesidade, um fator de risco estabelecido para, pelo menos, 13 tipos de câncer.
· Dietas ricas em alimentos processados tendem a ter uma alta contribuição de bebidas alcoólicas, o que pode ter explicado, em parte, a associação entre alimentos processados e risco de câncer neste estudo. Quando as bebidas alcoólicas foram removidas da classificação NOVA, as associações entre ingestão de alimentos processados e câncer retal, carcinoma hepatocelular e câncer de mama na pós-menopausa tornaram-se não significativas, sugerindo que o consumo de álcool provavelmente levou a esses cânceres associados.
· O aumento da ingestão de alimentos processados e ultraprocessados também pode aumentar o risco de câncer por meio da exposição a contaminantes químicos de embalagens de alimentos com propriedades cancerígenas, como dietil ftalato (DEP) e o bisfenol-A (BPA).
· Outros compostos não nutricionais que podem estar implicados no risco de câncer são aditivos alimentares específicos, tal como os conservantes, amplamente utilizados em alimentos ultraprocessados e processados e aditivos, tal como os aromatizantes e emulsificantes, usados na produção de alimentos ultraprocessados. O nitrato de sódio, por exemplo, é usado pelos fabricantes para conservar carnes e aves processadas e ultraprocessadas. Alguns estudos sugeriram que este composto pode aumentar o risco de câncer devido à formação de compostos nitrosos que podem produzir nitrosaminas cancerígenas. Além disso, supõe-se que alguns emulsificantes promovam inflamação do intestino que, também, é potencialmente associada à causa do câncer.
· Outra preocupação é o possível efeito dos adoçantes artificiais no risco de câncer que permanece controverso.

Conclusão

Este estudo fornece evidências do efeito do processamento de alimentos no risco de câncer e sugere que a substituição de produtos alimentícios processados e ultraprocessados por alimentos minimamente processados pode reduzir o risco de câncer geral e de alguns cânceres específicos.

Portanto, recomendações para incentivar o aumento do consumo de alimentos in natura e minimamente processados, enquanto se reduz o consumo de alimentos processados e ultraprocessados, poderiam ser integradas às estratégias de políticas públicas visando a prevenção do câncer.

Referência:

Nathalie Kliemann et al. Food processing and cancer risk in Europe: results from the prospective EPIC cohort study. Lancet Planet Health 2023;7: e219–32.

 

Receba novidades

WhatsApp